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PARIS, L'AMOUR (I)



       Falar de Paris, é falar dos seus estereótipos. Visitá-la é confrontar-se com outra realidade. A cidade reflete em suas ruas e bairros os impasses do Velho Continente neste início de século XX: um patrimônio notável, acumulado através dos séculos, e que constitui seu principal atrativo e fonte de renda; e uma pressão social crescente, com excesso de imigrantes e precariedade da vida em vários sentidos.


       Alguns mitos sobrevivem, mesmo se eles não coadunam com a realidade. Paris, cidade luz? - Bem, não é mais iluminada do que Nova Iorque ou Buenos Aires. Cidade romântica? - Para os turistas, sim, pois é isto que eles buscam em Paris. Mas o estilo protocolar de vida de seus habitantes e o stress das relações cotidianas simples deixam pouco lugar para o romantismo. Capital do turismo? – É provável. Muitos dos lugares mais populares de Paris existem por e pelos inúmeros estrangeiros que a visitam. 


         Enquanto turista, busco o belo e notável e faço olho cego para o que destoa de minhas expectativas. Recorto a realidade através de uma foto, de modo a excluir as mazelas da condição humana, o pobre, o sujo e o feio.  

       
       Île de la Cité, à esquerda, com Notre Dame ao fundo. O primeiro núcleo da cidade constitui ainda o centro do seu interesse histórico. A partir de Notre Dame, percorre-se o essencial do centro histórico da cidade, andando como se folheasse uma enciclopédia.

        
           Em um dia normal, Notre Dame está cheia de turistas.

      
        Em outro dia, está cercada por policiais do batalhão de choque, que visam impedir a realização de uma “manif”ou manifestação, uma espécie de passa tempo francês.

     
       Caminhar pelo cais da região central é agradável e pitoresco.

       
         Até a região do Museu do Luvre, cujo conjunto arquitetônico ocupa vários quarteirões.


       O Arco do Carroussel, com o Luvre ao fundo, passagem obrigatória de todo turista, tranqüilo ou apressado.


       Jardin des Tuilleries diante do Luvre. A presença do verde, assim como também da água, além da moderna pirâmide, quebram o cinza da arquitetura clássica.


       A Vênus de Milo só é menos popular que a Mona Lisa, sempre cercada de dezenas de fotógrafos (amadores).



       A Vitória de Samotrácia é outra grande dama do museu:



       Sua presença, do alto de um  pedestal, impõe-se sobre uma ala inteira. Por si só vale o ingresso.




       Domingo de manhã e feira de arte, programa bem parisiense. Acima Montparnasse; abaixo Porte de Clignancourt, mercado bastante popular, com grande presença de imigrantes nas redondezas, muitos dos quais oferecendo bugingangas ocultas na parte interna do paletó, tal qual nas histórias em quadrinhos.




        Abaixo, arrumação interna de uma loja de bric-à-brac. Ao me ver tirarando a foto, a dona saiu quente de dentro e veio me interpelar. "Ce n'est qu'un souvenir", disse eu a ela, deixando  claro que eu era um simples turista. "Je m'en doutais", ela respondeu, sugerindo que percebia bem que eu era turista (já que eu não conhecia a etiqueta, que consistia em  "pedir permissão para tirar a foto"). Ela se mostrou gentil e educada depois, mas reagiu no primeiro momento com um reflexo bem parisiense , a saber,  a tendência a interpelar e "corrigir" o comportamento do outro, a pretexto de etiqueta e cidadania. Esta é a razão de muitos desentendimentos entre parisienses e turistas.


       Bar - Restaurant Chez Louisette em Clignancourt, visto na foto abaixo. Como numa máquina do tempo, sua atmosfera decadente e caricatural nos faz voltar cinquenta anos ao entrarmos através da porta.  Tem damas maduras, música de cabaré (mas também  bossa nova!) e convida a secar pelo menos meia  garrafa de vinho, antes de ganhar a saída. 

          Cheguei no lugar e fiquei. Depois de tomar a meia garrafa de vinho, acompanhada de um ótimo paté de campagne, fui ao banheiro por dois minutos e, ao voltar, o dono e os empregados estavam arrancando os cabelos, porque "estava na hora de fechar". Esses franceses! Oferecem um espetáculo de boemia  e preguiça e, quando os fregueses estão mais animados, fecham o lugar com a pressa de quem vai tirar o pai da forca. São os costumes do lugar. 



        Saint-Germain tem a fama de "bairro de intelectuais" e mantém alguns dos locais mais cultuados da cidade para quem quer tomar um café, ficar duas horas conversando e depois pagar 30 euros.  O Café de Flore, 




e o Deux Magots ficam frente a frente:

   Já Montmartre é um bairro essencialmente turístico, com maior predominância de estrangeiros do que de parisienses. Isso dá a ele um ar de parque de diversões permanente, com músicos de todos os estilos tocando em praças, bares e escadarias.


       Mas Montmartre merece muito mais do que algumas fotos em um pé de postagem. Por isso, tratarei do bairro e de outros pontos de Paris em  uma próxima crônica. Merci et  à tout à l'heure, das escadarias do Sacré-Coeur.



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(Abrão Brito Lacerda)

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